Milão: Segredos e Mistérios da ‘Última Ceia’ de Leonardo da Vinci

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Maria Madalena teria sido retratada no lugar de João? De onde veio a inspiração de Leonardo da Vinci para as feições dos apóstolos? A forma como estão posicionados à mesa tem algo a nos revelar? Existe uma música escondida nesta pintura? São muitos os mistérios que envolvem uma das obras de arte mais incríveis e valiosas do mundo. Uma joia artística que não se encontra exposta em nenhum museu ou galeria, mas sim, na parede do refeitório de um convento.

Era tradição pintar a cena da Última Ceia em refeitórios no final do século XV, no entanto, quando convidaram Leonardo da Vinci para decorar o refeitório do convento da igreja Santa Maria delle Grazie em Milão, na Itália, era previsto que ele não faria uma mera pintura decorativa.

Igreja Santa Maria delle Grazie – Milão Itália. Foto: Arquivo Pessoal

Foram três anos, entre 1495 e 1498, que Leonardo da Vinci se dedicou nesta sua obra prima. Boa parte deste tempo da Vinci dispensou andando pelas ruas de Milão observando as pessoas a procura de rostos que lhe inspirassem para cada um dos doze apóstolos. Relatos dão conta de que, para encontrar a pessoa com a feição ideal para Judas Iscariotes (o traidor), Leonardo teria visitado alguns presídios de Milão e teria se inspirado em um criminoso. Há quem especule também que o rosto de Judas teria sido inspirado em um padre que foi executado pelo Papa Alexandre VI em 1498, ano da conclusão da obra. Entre diversos rostos retratados, ainda há uma teoria que diz que o rosto do apóstolo Judas Tadeu (não o Iscariotes), seria um auto-retrato do próprio Leonardo da Vinci.

João ou Maria Madalena?

A cena retratada na obra representa o exato momento em que os discípulos recebem a notícia de que um deles iria trair Jesus:

“… Em verdade, em verdade vos digo que um de vós me há de trair.
Os discípulos olharam uns para os outros, sem saber a quem ele se referia.”

João 13:21-22

Uma curiosidade é que, exceto Jesus e João, todos os demais discípulos demonstram uma inquietação e nervosismo ao receberem a notícia de que um deles trairia o mestre. João é retratado de forma tranquila e serena, como se ele tivesse a tranquilidade de saber que não seria ele o traidor.

Algumas teorias dão conta de que na verdade não seria João o retratado nesta imagem, mas sim, Maria Madalena, e para quem analisa a foto sem saber que se trata de João, a primeira percepção é que, de fato, se trata de uma mulher. Há quem consiga ver até mesmo a silhueta de um seio, o que eu acho que já seria um exagero mesmo. No entanto, é muito curioso tentar imaginar por que Leonardo da Vinci retratou João com traços tão delicados e femininos.

Restauração digital revela traços femininos em João. Fonte: Leonardo Research

Os discípulos estão todos distribuídos em quatro blocos de três apóstolos. Aliás, o número três aparece diversas vezes na obra: Três janelas, diversas formas triangulares etc. Na bíblia encontramos algumas referências importantes sobre o três: Pai, Filho e Espírito Santo, ou ainda Mente, Corpo e Alma. Na pintura, a posição em que Jesus se encontra forma um triângulo perfeito e o espaço entre ele e João (ou Maria Madalena) também forma um outro triângulo perfeito. Aliás, existem 4 triângulos na pintura que formam duas vezes a letra M (Maria Madalena). Para aumentar ainda as especulações sobre os dois, nota-se que as roupas de Jesus e João (ou Maria Madalena) se complementam, apresentando as mesas cores porém de forma invertida. Tudo isto apenas aumenta o imaginário e mostra o quão esta pintura é complexa.

Seria este um dos sinais de que a representação é de Maria Madalena e não de João?

Maria Madalena teria este lugar tão privilegiado na obra pois, para alguns teóricos, ela teve um papel fundamental na vida de Jesus. Para muitos, ela teria sido a esposa de Jesus e teria uma contribuição significativa na propagação do evangelho. Esta teoria foi a inspiração de Dan Brown para escrever “O Código Da Vinci”, um best-seller que virou filme.

A posição de Jesus é estratégica. Ele é o centro da pintura que utiliza-se de uma perspectiva perfeita. Diferente das representações da época, Jesus não foi simbolizado com a tradicional auréola que demonstra santidade. Para transmitir a mesma sensação, o artista preferiu utilizar a iluminação da janela que se encontra atrás de Jesus para dar este efeito.

Jesus está perfeitamente ao centro da obra.

Restauros

Leonardo da Vinci tentou inovar criando uma técnica única para pintura. Na época, utilizava-se o afresco, uma técnica que envolve pintar o gesso ainda úmido concluindo a pintura antes que ele se secasse. No entanto, como Leonardo desejava fazer algo muito mais elaborado e que levaria muito mais tempo para ser concluído do que o usual, ele desenvolveu uma técnica de pintura em gesso seco, que em pouco tempo se demonstrou muito ineficaz e a pintura começou a se deteriorar, o que demandou diversos restauros.

Ao longo dos seus mais de 500 anos, a imensa obra de 9 x 4,5 metros, passou por diversos restauros e muitos deles rudimentares, fazendo com que a obra fosse perdendo sua qualidade original. O último restauro foi iniciado em 1979 e concluído apenas em 1999. Foram 20 anos utilizando-se de técnicas de reflectância por infravermelho para identificar e separar todas as camadas de restauros já realizadas até conseguir chegar na pintura original.

A Última Ceia de Leonardo da Vinci. Foto: Arquivo Pessoal

A obra ainda sobreviveu a diversas guerras, incluindo um bombardeio aéreo que atingiu a igreja durante a II Guerra Mundial. Hoje a pintura se encontra preservada e o que vemos é a mais próxima possível da idealizada e realizada por Leonardo da Vinci.

A música escondida

Como se todos estas teorias e curiosidades não fossem o suficiente, um músico italiano chamado Giovanni Maria Pala fez um estudo minucioso dos escritos de Leonardo da Vinci, além de fazer uma análise detalhada da Última Ceia e encontrou alguns padrões curiosos.

O primeiro é a forma como as marcas de dobra da toalha da mesa estão posicionadas, formando o que seria um partitura musical. Após encontrar este padrão, ele começou a reparar nos pães, na mesa, e na posição das mãos dos apóstolos, e encontrou notas musicais que formavam uma curiosa melodia.

A música escondida na Última Ceia.

Embora pareça um enorme malabarismo teórico, as chances destes elementos serem aleatórios é muito pequena e acredita-se realmente que foram colocados por Leonardo da Vinci de propósito, uma vez que ele também era músico. Além disto, a sonoridade da melodia transmite uma sensação de mistério e profundidade, que tem tudo a ver com sua enigmática obra.

Uma última curiosidade é que a música é tocada ao contrário, uma vez que Leonardo da Vinci tinha esta peculiaridade: ele gostava de escrever da direita para a esquerda.

Você consegue ouvir esta melodia abaixo:

Esta é só uma pequena amostra das teorias mirabolantes que envolvem esta incrível obra de arte. Há quem encontre uma profecia para o fim do mundo no ano 4006, quem jure ter uma imagem do suposto filho de Jesus com Maria Madalena e até quem faça relações com atividades extra-terrestres e astrologia.

Controvérsias, teorias, misticismos e viagens na maionese a parte, visitar este convento e ver esta pintura de perto é um enorme privilégio. Ah, e caso queira vê-la pessoalmente em uma eventual viagem à Milão, lembre-se de fazer o agendamento com muita antecedência. A quantidade de pessoas que podem vê-la por dia é muito limitada e a fila de espera é de no mínimo 3 meses.

Foto escura pois não é permitido usar flash e a iluminação interna é baixa para preservar a pintura. Foto: Arquivo Pessoal

 

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